Aviação aposta em combustíveis sustentáveis para descarbonização do setor

O voo do brasileiro Alberto Santos Dumont com o 14-Bis, em Paris, fez o mundo olhar para o futuro e para o céu de forma diferente. Desde o feito histórico do “Pai da Aviação”, que celebraria 150 anos em 20 de julho, o Brasil seguiu inovando na aviação e, hoje, busca desenvolver combustíveis de aviação sustentável, a exemplo do biodisel – outra conquista com selo brasileiro.

Mas existe combustível de aviação sustentável? A resposta é sim e ele tem sido a aposta de diversas empresas para acelerar a descarbonização do setor aéreo. Isso porque, a partir de 2027, os aviões não poderão levantar voo entre vários destinos internacionais se não compensarem as emissões de gases do efeito estufa (GEE) por meio:

  1. da compra de créditos de carbono
  2. ou do abastecimento por uma mistura mínima de SAF, sigla em inglês para o combustível sustentável de aviação.

Além da meta de 2027, as 290 companhias dos 120 países que integram a Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata) têm os desafios:

  • de reduzir gradualmente a emissão líquida de dióxido de carbono (CO2) da aviação comercial até 2050, quando os voos deverão ser neutros em carbono;
  • e, antes mesmo de 2050, atender a uma resolução da Organização Internacional da Aviação Civil (Icao), uma das agências das Nações Unidas, que estabelece que as emissões GEE do setor se estabilizem nos patamares observados em 2019.

Propostas desafiadoras para um setor que, segundo estimativa da Icao, responde por 2,5% das emissões globais de GEE.

Por isso, as companhias iniciaram uma corrida para aumentar a eficiência das aeronaves, melhorar as rotas de voos e estabelecer mecanismos de compensação, quando a emissão for inevitável. E a decolagem rumo à descarbanonização tem se dado pelo SAF, que pode reduzir até 65% das emissões de GEE do setor.

Criador do 14-Bis, Alberto Santos Dumont celebraria 150 anos em 20 de julho

Mas afinal qual é a diferença do SAF para os combustíveis convencionais?

A principal diferença entre o combustível de aviação sustentável e os convencionais é a matéria-prima. O querosene é um derivado do petróleo, assim como a gasolina. Já os SAFs podem ser produzidos a partir de biomassa, como plantas, resíduos florestais, óleos vegetais e açúcares.

Sabe o etanol, obtido a partir de cana-de-açúcar, e o biodiesel, produzido por meio de óleos vegetais ou de gorduras animais, e adicionado ao diesel? Então, o combustível de aviação sustentável também segue a mesma cartilha e, para ser usado comercialmente em toda a frota aérea, deve ser misturado com combustível de aviação convencional.

No Brasil, existe regulamentação da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) e, internacional (American Society for Testing and Materials), indicando que o combustível renovável pode ser misturado com querosene de aviação de origem fóssil em até 50% da composição.

De acordo com a Iata, há cerca de 100 projetos de fabricação de SAF em 30 países. A marioria, no entanto, fica nos Estados Unidos e na Europa.

E, por aqui, já temos SAF?

Conhecimento tecnológico e disponibilidade de insumos não faltam para que o Brasil seja um dos principais produtores mundiais de SAF, mas o país ainda não tem um plano de ação definido para ocupar esse espaço.

Apesar disso, universidades e centros de pesquisa trabalham no desenvolvimento de novas tecnologias capazes de colocar o Brasil em posição de destaque nessa corrida pela descarbonização do setor aéreo.

É o caso do Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER), localizado em Natal, no Rio Grande do Norte. Em parceria com a Agência de Cooperação Internacional Alemã (Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit – GIZ), os pesquisadores desenvolveram metodologia para produção de SAF, um querosene sintético renovável, e ainda conseguiram dar uma destinação sustentável para o coproduto da indústria do biodiesel que passou a acumular no mercado brasileiro: a glicerina.

O ISI-ER já trabalhava com a glicerina, um subproduto da indústria do biodiesel. Depois que o governo federal autorizou o aumento gradual dos percentuais de adição do biodiesel no óleo diesel, houve, consequentemente, o crescimento da produção dessa glicerina.

“A glicerina bruta tem alto valor energético, mas baixo valor comercial. Então, juntamos a necessidade de trazer um valor agregado para a glicerina e de desenvolver um combustível sustentável para a aviação”, afirmou o coordenador do projeto, Antônio Medeiros.

Estudos desenvolvidos nos últimos 11 anos pelos pesquisadores que lideram o projeto identificaram diversas vantagens no uso da glicerina. Uma delas é que a emissão de dióxido de carbono (CO2) para produção de combustível sintético com essa matéria-prima é praticamente nula.